quinta-feira, maio 12, 2011

Lembro me ainda de ouvir você comentando com seus amigos sobre os peitos da Paula. Dizia como eles olhavam pro céu, de algum jeito que eu não sei bem parafrasear, e apontava com os dedos para cima. Primeiro eu senti inveja da atenção aos peitos da Paula. Depois contei à Paula, pra quem sabe ela ficar contente. Paula me repreendeu como se eu não entendesse bem o desrespeito. Eles não deviam falar assim dos nosso peitos. Eu não soube replicar, o que eu sei agora. Diria que esse tipo de comentário não era muito diferente do que a gente dizia a seu respeito. Eu gostava muito das costas do seu joelho. As costas do seu joelho eram as mais bonitas da escola, não havia outro garoto que tivesse costas de joelho feito as suas. Torcia pelas bermudas que deixavam seu joelho de fora. E o que eu faria com as costas do seu joelho? Não sei. Nunca mais olhei pras costas do joelho de ninguém depois daquela época. O que a gente ansiava mesmo? Não era sexo. Era qualquer coisa de calor humano antes disso.

Eu continuo, na maior parte do tempo, sem réplica para esses pequenos desrespeitos. Nunca tive coragem de dizer à Paula, que entre toda essa reeprensão ao seu comentários, ela soltava risinhos contraditórios, orgulhosa de seus peitinhos que apontavam ao céu.


(Ilustração pela ilustrissima, Luisa Amoroso)

segunda-feira, maio 02, 2011


Eu não gosto de sair por ai contando que já fui pra Europa. Acho que tem gente que fica ofendida. Acho que tem gente que acha que estou me exibindo. Pior de tudo, tenho medo mesmo de estar me exibindo. Então evito. Mas não dá pra contar essa história sem dizer que se passa na França. Não só porque aconteceu no Louvre e não sei bem onde reproduzir uma situação com esculturas greco-romanas no Brasil, mas também porque ela não poderia acontecer em qualquer outro lugar. Ou só gosto de pensar assim.

Eu devia ter uns dez anos e passeava entre as estatuas Greco-Romanas com a minha família.

Quando eu era criança, vivia com vontade de tocar nas obras e verdade seja dita, eu toquei em um monte de coisa no Brasil. Mas acho que os seguranças estrangeiros me intimidavam mais e pior, as obras davam muito mais vontade de tocar.

Museu pra criança é significado de pornografia liberada. Essa gente pelada não tem problema de olhar. Eu achava particularmente engraçado olhar os pintos. Pintos eram mesmo muito raros de se ver na nossa infância. A internet não era lá coisa muito bem estabelecida. Mulher pelada sempre existiu em todo canto, então pintos causavam mais frisson. Eu me lembro especificamente de uma escultura, claro que essa história contribuiu pra reforçar a lembrança, mas a estatua em si já era muito interessante; a Hemafrodite, se você olha ela de um lado, ela tem o bumbum (e acho que esse termo pode ser usado às vezes para se referir a uma bunda absolutamente perfeita) feminino, o mais bonito da sala, mas do outro lado, e você tem que dar a volta toda para perceber ela tem um pinto.

Minha mãe me explicava que hemafroditas são pessoas que nascem com os dois sexos. E que na mitologia era o filho de Hermes e Afrodite, mas eu me perdi na história quando um moço abriu a braguilha pra olhar a bunda da ninfa. Eu não avisei ninguém porque sabia que imediatamente perderia o espetáculo, era muita educação sexual em um único dia. Minha mãe me tirou do camarote no momento em que a amiga da minha tia... eu deveria ter apresentado a amiga da minha tia antes, ela era uma dessas pessoas que ninguém sabia muito bem o porquê da gente manter por perto. Todo mundo da família falava mal dela e dizia como era chata e dizia como era exibida, mas ninguém dizia "não" quando ela queria viajar com a gente. Pois bem, a amiga da minha tia começou a aplaudir o homem de braguilha aberta. E não sei muito bem como eu entendi isso, mas hoje eu entendo mais ou menos que ela achou que aquilo era um tipo de performance em elogio à obra de arte. Acontece que esse tipo de comportamento, que na maioria das vezes é tomado como loucura, em uma sala cheia de turistas, divide opiniões. Então um bando de gente chegou mais perto pra entender o que acontecia e teve até quem viesse aplaudir também. Finalmente, apareceu uma segurança, ela era muito séria, dava mesmo muito mais medo que as seguranças do Brasil.

A segurança chegou e pediu para o moço de braguilha aberta parar o que ele estava fazendo. Acho que em outros lugares do mundo ela teria segurado o cara e chamado reforço para tirar ele de lá. Mas essa segurança pediu, com uma voz muito firme, para ele por favor parar com o que estava fazendo. E antes que ele pudesse reagir, a amiga da minha tia tentou defender o homem com o pouco francês que ela tinha. Soltou um "poétique" um "le orgasme" e outro "l'oeuvre d'art", até que um espanhol se habilitou a traduzi-la, e ela começou a brigar com a guarda em portunhol, dizendo coisas que talvez nem em português soubesse dizer. Ela disse que aquilo era um demonstração de arte e que a segurança deveria deixar ser. A segurança estava irada, nem sei como a amiga da minha tia não ficou com medo dela. Respondeu que se o homem quisesse fazer uma performance (sem nem questionar se aquilo era de fato uma performance) ele precisava de uma autorização da diretoria do museu. Sem a autorização, era completamente proibido se manifestar daquela maneira. A amiga da minha tia disse que a arte não tinha que pedir autorização à ninguém, deveria apenas acontecer. Meu pai estava revoltado com a situação e discutia com meus tios sobre como tirar a amiga da minha tia do museu. Nesse instante consegui tapear minha mãe e voltei ao camarote. O homem de braguilha aberta continuava na sua empreitada. A segurança explicava que ela não tinha nada que ver com isso e que estava apenas fazendo o trabalho dela. E a amiga da minha tia replicava que a segurança não podia se resumir ao trabalho dela, que ela não poderia castrar um autor daquela forma e que ela poderia ser como uma curadora naquele momento. Eu lembro da palavra curadora, aprendi ela nesse dia. E foi por ai que eu interrompi a discussão com um pequeno grito de susto, talvez a segurança e amiga da minha tia nem percebessem o que acontecera, não fosse meu grito. O homem gozou na bunda da Hemafrodite e eu não sabia o que aquilo era. Sei que a amiga da minha tia e a segurança empalideceram e se calaram completamente. O circulo de palmas se dispersou rapidamente.

A amiga da minha tia passou o resto do dia em silêncio, talvez pensando que fora responsável pela demissão da segurança e que fora culpada pela deteriorização de uma obra de arte. Ou pensando que não deveria mesmo ter viajado com a gente. Durante o jantar, meu primo, não sei se aproveitando de uma imunidade infantil para ativar o caos ou se por pura ingenuidade, perguntou porque ela estava tão quieta e com tanta cara de susto.


(a foto é do Flickr Foraggio Fotographic)

sábado, fevereiro 05, 2011

Tô de Turista hoje no Finestrino, escrevendo não ficção!