terça-feira, fevereiro 23, 2010


Eu precisava dizer. Te vi entrando com um homem, em um motel, quarta feira passada, na hora do almoço. Eu não quero nada de você, é só que eu precisava contar isso para alguém. Eu não estava fazendo nada de errado ali, eu trabalho duas quadras dali, no prédio antigo da direita. Muita gente do trabalho vai naquele motel. Não que eu saiba muitos detalhes da vida sexual das pessoas com quem eu convivo. Mas as vezes as pessoas contam, não acho nada de errado. essas pessoas são solteiras, fazem o que quiserem da vida delas. não estou te julgando por ir ao motel com um homem que não é seu marido. Na verdade, estou te julgando sim. Mas veja bem, é um direito meu. Estou explodindo com essa história. precisava contar a alguém. e eu posso até ser conservadora e achar que mulheres casadas não devem ir ao motel com homens que não são seus maridos, mas futriqueira eu não sou.

Talvez eu seja futriqueira, eu só não tinha a quem contra mesmo.

Não queria contar ao meu marido e se ele não ficasse chocado? Eu ficaria arrasada.

Tão pouco poderia contar as minhas amigas. eu não suportaria o cinismo julgamentoso delas com você. eu nem te conheço, eu sei. mas não gostaria de resumi-la a adultera, a mulher sem moral...

O que de fato pensei em fazer foi contar ao meu filho. Eu diria "não quero que você ande mais com o Marcos, a mãe dele tem feito coisas reprováveis". Seria especialmente cruel, me vingar de você pelo seu filho. Me vingar de você, de você que tem tempo, que tem corpo e que tem desprendimento para ter um caso. Não é como se eu quisesse ter um caso, mas eu gostaria de ter todas essas coisas que são necessárias pra ter um caso.

no final eu nunca faria mal nem a você, e nem ao seu filho. Precisa de um pouco menos de sanidade. Mas é disso mesmo que estou falando. de sanidade. dessa necessidade que a gente tem de ser sã para conviver com tudo na vida. manter essa sanidade enlouquece a gente. ter um caso é uma vasão de insanidade, um breve momento de liberdade. é isso que não sai da minha cabeça. é isso que me faz passar na frente do motel algumas vezes antes de entrar no trabalho. procurando você. eu passo lá procurando por você. eu trabalho olhando o motel pela janela. e não tem como ver nada. mas te imagino naquela janela.

Outro dia eu entrei no motel. eu passei na farmácia antes. comprei camisinhas, com bastante cuidado, como uma mulher com um caso secreto faria. Ao lado da farmácia havia uma loja de lingerie. E eu não teria ido tão longe mas loja estava ali do lado. Comprei um conjunto vermelho, nunca achei lingerie vermelha bonita de fato, é vulgar de mais. comprei mesmo assim.

Esperei a rua estar completamente vazia. Entrei no motel, pedi um quarto com duas garagens. O quarto era exatamente como eu imaginava, não havia qualquer glamour, o chão de azulejo, o colchão revestido de plástico, os quadros eróticos na parede. Senti um certo prazer em saber que eu não era o tipo de mulher que tem que me submeter a esse tipo de lugar. e você é. pedi uma champagne e fiquei esperando meu amante chegar deitada na cama com a minha lingerie vermelha.

Eu não tenho um amante, acho que você entendeu isso. foi o que eu fiz. em casa eu escondi a lingerie. No trabalho eu tive que justificar algumas horas a mais de almoço. Ninguém desconfiou que eu tivesse um caso. acho que meu marido nunca vai encontrar meu conjunto vermelho.

mas era sobre sanidade. é que eu precisava deixar toda essa loucura sair por algum lugar. essa obsessão com você, com um caso, com o motel. eu precisava contar a alguém. e com você eu não tenho nada a perder. Você eu posso torturar com a minha loucura.

Um comentário:

Murdock disse...

Lembrei do "Elogio da Loucura", do Erasmo de Roterdã. Os loucos parecem ser mais interessantes.